quarta-feira, 29 de novembro de 2017

O Perfil dos professores do Ensino Básico no Brasil e o PNE

"É preciso reconhecer a necessidade de avançar em estudos mais detalhados para poder formular políticas públicas de Educação com foco nas condições de vida e trabalho dos educadores", afirma Milko Matijascic, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

Marcos Santos/USP Imagens/ Fotos Públicas
O Plano Nacional de Educação (PNE) foi aprovado em 2014. Caso sejam cumpridas as suas vinte metas, ocorrerá uma transformação decisiva para a melhoria no atendimento e, sobretudo, na qualidade da Educação brasileira. A avaliação conjunta de todas essas metas e respectivas estratégias é uma tarefa de grande porte que já vem sendo empreendida por instituições de peso como o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e o Todos Pela Educação, a quem agradeço a concessão deste importante espaço para divulgar os esforços de pesquisa.

O presente artigo tem por objetivo sintetizar os principais resultados da pesquisa que focalizou as grandes regiões geográficas brasileiras e apresentou detalhes das situações de domicílio metropolitanas, urbanas não metropolitanas e rurais. Como a quantidade de informações é muito grande, nosso objetivo no presente contexto enfoca o Brasil segundo a situação de domicílio. Os resultados mais precisos e análises mais detalhadas podem ser encontrados no Texto para Discussão (TD) 2304 do IPEA.

O foco do TD 2304 do Ipea foi verificar as condições de vida, inserção no mercado de trabalho e a remuneração dos professores da Educação Básica a partir dos dados divulgados pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), realizada peloInstituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A opção pela Pnad teve por objetivo verificar as condições gerais para todos os professores do Brasil em temas que somente essa fonte ou o Censo Demográfico, já um tanto defasado, podem realizar. Mais importante: a Pnad serviu de opção para o próprio PNE para verificar a evolução dos salários dos professores, sendo possível também medir o seu nível de formação. Os resultados obtidos para o Brasil contam com indicadores importantes que devem estar na mira dos formuladores de políticas públicas, uma vez que o estudo abordou temas relativos às metas 15, 16 e, sobretudo, 17 do PNE.

Os resultados mostram que existe uma inserção preponderante de mulheres enquanto professoras, com uma maior participação das que são brancas. No entanto, homens e mulheres negros ganham mais importância nas regiões urbanas não metropolitanas e, sobretudo, nas rurais. Os professores possuem uma participação menor na condição de pessoa de referência no domicílio e também um menor número de filhos em relação aos demais ocupados. Além disso, a inserção de professores em domicílios com renda inferior à linha de pobreza (abaixo de meio salário mínimo per capita) ou de indigência (com renda per capita inferior a um quarto do salário mínimo) é bem menor que nas demais ocupações, mas pode atingir um total de 14,7% em áreas rurais ou de 4,4% nas urbanas. Ou seja: isso requer atenção para poder atingir as metas propostas pelo PNE.

Quando o tema é a posição na ocupação, os professores da Educação Básica são quase que exclusivamente assalariados, pois 99,1% deles estão nessa condição. Os dados também revelam que 94,1% deles contribuem para a previdência, o que é notável em relação aos demais trabalhadores onde esse patamar é inferior a 60%. Outra característica importante é que os professores da Educação Básica empregados pelo setor público federal representam um contingente marginal. Já as demais formas de emprego, ou seja, o setor público estadual ou municipal e o setor privado, contam com um número de empregados similar nas regiões metropolitanas. No entanto, nas áreas urbanas não metropolitanas e, principalmente, rurais, é o setor público municipal o principal empregador.

Mais de 10% dos professores de escolas públicas estaduais e municipais possuem mais de uma atividade docente, com uma incidência um pouco menor nas áreas rurais. Esses resultados representam o dobro do obtido nas demais ocupações. O número mais modesto para a iniciativa privada revela que a maioria professores que também atuam no setor público consideram ser este o seu emprego principal. Esses resultados também são válidos para mais de uma atividade, não se detendo apenas nas docentes, mas, nesse caso, os indicadores se aproximam de 20% para os professores de escolas estaduais, 15% nas municipais e oscila entre 10% e 20% nas privadas metropolitanas e urbanas não metropolitanas, respectivamente. Esses patamares são elevados e requerem atenção, pois a maioria das escolas com bom desempenho no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) contam com professores que possuem dedicação exclusiva a apenas uma escola.

A escolaridade dos professores é uma questão importante. Em escolas estaduais, cerca de 11% dos professores em áreas urbanas não possuem Ensino Superior. Nas escolas municipais, esse patamar oscila entre 16 e 21% e nas privadas, entre 25 e 28% para regiões metropolitanas e nas demais urbanas. Para as escolas rurais esse patamar é sempre superior a 30%. Fica claro, portanto, onde deve se concentrar o esforço para qualificar os professores.

O número de professores com Pós-graduação ainda é muito reduzido no Brasil e será um grande desafio atingir um contingente de 50% estabelecido pelo PNE para 2024, quando se encerra a sua vigência.

Em matéria de remuneração, os professores em áreas metropolitanas auferem salários maiores que os de outras áreas urbanas e estes, por sua vez, possuem remunerações bem superior à dos colegas nas áreas rurais. Professores empregados no serviço público recebem salários maiores que os da iniciativa privada. No âmbito do setor público, os professores federais recebem os salários mais elevados, ultrapassando, em muitas regiões, a média salarial para profissionais com nível superior. Os professores da rede estadual, por sua vez, recebem salários menores que os da esfera federal, mas superiores aos da municipal – sendo que os últimos concentram o maior número de docentes da Educação Básica no Brasil.

Por fim, é possível verificar que os professores com mais de uma ocupação recebem remunerações maiores em relação àqueles que possuem um único emprego. Quando os professores atuam em atividades secundárias não docentes, suas remunerações, não raro, são maiores nessa atividade. Isso poderia se explicar pelo fato de existirem professores que atuam no mercado de trabalho devido ao conhecimento profissional que possuem, ajudando a formar as gerações mais novas. Por outro lado, se a adoção de outra atividade visa apenas a complementação de renda, esse é um fator negativo, pois os professores deveriam receber bons salários que permitissem o sustento de sua família. Isso reforça a necessidade de elevação dos salários docentes com um meio eficaz para melhorar a qualidade da Educação, conforme preconiza o PNE.

Diante do exposto, é preciso reconhecer a necessidade de avançar em estudos mais detalhados, com bases de dados que atinjam os municípios e cada uma das escolas existentes, para poder formular políticas públicas de Educação com foco nas condições de vida e trabalho dos professores. Esse é um aspecto muito relevante para promover a retomada do desenvolvimento do País em bases sustentáveis.

*Milko Matijascic é técnico de Planejamento e Pesquisa pelo Ipea. Doutor em Economia pela UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas desde 2002 – e Bachelier en Sciences Économiques et Sociales pela Academia de Poitiers (França, 1983). Integra, desde 2008, o comitê Científico da AISS – Associação Internacional de Seguridade Social – e da Revista Internacional de Seguridade Social.

Todos Pela Educação

http://educacao.estadao.com.br

Nenhum comentário:

Postar um comentário