quinta-feira, 7 de novembro de 2013

VAMOS BOTAR A MÃO NA MASSA?

Educadores e especialistas de diversos setores comentam a importância do engajamento da sociedade no sistema de aprendizagem

E se a Educação fosse realmente encarada com o valor social que tem? E se cada pai, irmão ou tio perguntasse a sua criança como foi o dia dela na Escola? E se você se juntasse a outros e dedicasse algumas horas na semana a um projeto na área do Ensino?

A Educação muda a sociedade, preserva seus valores e permite desenvolvimento. E se a sociedade unisse esforços para retribuir e, desta vez, invertendo a ordem, transformasse a Educação?

Essas perguntas pretendem promover uma reflexão sobre o compromisso de cada um, e não apenas de gestores e Professores, no processo educacional.

Para reunir exemplos de que ações simples levam a resultados concretos, Zero Hora conversou com Educadores, especialistas e também com gente que não teria ligação nenhuma com o mundo do Ensino, não fosse a inquietação de querer mudá-lo.

Da Finlândia, veio a certeza de que a presença da comunidade é fundamental para que a Escola pública se torne uma opção atrativa – a confirmação é da própria ministra da Educação do país, Jaana Palojärvi.

Mas existem muitas outras convicções como essa que já se espalham há tempos pelo Brasil. Uma delas é defendida pela diretora-executiva do movimento Todos Pela Educação, Priscila Cruz:

– Uma sociedade que valoriza o conhecimento sabe claramente que é seu o dever de tornar mais fértil o terreno da Educação. O produto da sociedade é aquilo que ela valoriza.
O gaúcho Eduardo Lima sabe disso. Largou a publicidade para criar um canal de vídeos educativos e gratuitos na internet. Maluco? Não. Convicto.

– Não importa se você pode ajudar uma ou um milhão de pessoas. Cada um sempre poderá ser uma revolução à sua escala – ele responde.

Vamos botar a mão na massa? A importância do engajamento da sociedade no sistema de aprendizagem é tema da campanha A Educação Precisa de Respostas, promovida pelo Grupo RBS e pela Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho.

Educação, compromisso de todos
A Bruxa será a porta-voz desta nova fase da campanha A Educação Precisa de Respostas, promovida pelo Grupo RBS e pela Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho. Ao lado da Bruxinha, a personagem vai mobilizar a sociedade a dar prioridade para a Educação, estimulando a qualidade da aprendizagem e o aperfeiçoamento da gestão Escolar no Brasil.


Escola de Pais: aprenda a participar
Sempre que tira uma boa nota na Escola, Taís Heck, 13 anos, corre até o pai para exibir seu desempenho. Para o vigilante Vilson Heck, 46 anos, cada uma destas demonstrações de orgulho da filha é um convite para que ele participe, sempre e cada vez mais, da comunidade Escolar em que está inserido.

É por isso que Vilson faz parte, desde o início do ano, da Escola de Pais criada na instituição em que Taís frequenta o 8º ano, a Escola Municipal de Ensino fundamental Vereador Antônio Giúdice, no bairro Humaitá, em Porto Alegre. O colégio ficou em primeiro lugar no último Ideb (anos finais) entre as Escolas municipais da Capital.

Em encontros mensais, o grupo recebe profissionais para discutir temas ligados à adolescência, como sexualidade e drogas, e também se envolve em aspectos administrativos da Escola, como planejamento do ano letivo, organização das festas e identificação de prioridades para os investimentos.

– Está entre os deveres dos pais mostrar aos filhos o quanto a Escola é importante para o desenvolvimento deles como cidadãos. A Escola de Pais surgiu para que a família e a Escola possam compartilhar os atos de educar e ensinar – afirma a vice-diretora Adriana Branchelli.

Neste primeiro ano do projeto, o número de pais que se envolvem com a iniciativa ainda não chega a 10. Vilson sabe que muitas famílias não conseguem conciliar os horários de trabalho com a atenção à Escola, mas vê outros motivos para a pouca procura:

– Tem pais que acham que a Escola é um depósito, onde se pode largar e pegar as crianças depois do trabalho. Por isso, muitas famílias nem conhecem os Professores. Não é assim. É preciso estar perto para acompanhar e ajudar nas dificuldades que surgirem. A Escola é uma extensão da casa.

“A sociedade civil tem um grande papel na Educação”
O país tem a metade da população do Rio Grande do Sul e ostenta um dos melhores sistemas educacionais do mundo. Na Finlândia, as crianças estudam menos que no Brasil, mas aprendem e se divertem mais. Qual o segredo do sucesso? Em entrevista a Zero Hora, feita por e-mail, a ministra de Educação da Finlândia, Jaana Palojärvi, conta como foi o processo que colocou o país nórdico em posição de destaque nos rankings do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa).

Zero Hora – A Finlândia é exemplo mundial de que é possível ter Educação gratuita e de qualidade. Como se chegou a esse modelo?

Jaana Palojärvi – Na Finlândia, há muito tempo se considera importante oferecer oportunidades iguais e de qualidade para todos os cidadãos, que são o maior recurso que um país pequeno pode ter. Acreditamos que, independentemente da origem socioeconômica, todos devem participar e avançar no caminho da Educação. Para que isso acontecesse, foi preciso focar especialmente em um desenvolvimento de longo prazo.

A reforma do Ensino fundamental na Finlândia prolongou a obrigação do estudo e acabou com uma prática que existia antes, de as crianças serem divididas em dois grupos: as que continuavam e as que encerravam os estudos. Hoje, todos têm a oportunidades de continuar. E os resultados são excelentes tanto para Alunos que antes tinham desempenho inferior quanto para os “melhores” Alunos.

ZH – Qual a contribuição do engajamento da sociedade no processo de desenvolvimento da Educação?

Jaana – Na Finlândia, existe uma tradição de Educação popular voluntária que continua até hoje. Os adultos finlandeses também são os mais capazes de utilizar, no dia a dia, os conhecimentos e as competências que adquiriram ao longo da vida. Grande parte desta Educação acontece em associações e centros de Ensino voluntários voltados para adultos. A sociedade civil tem um grande papel na Educação e contribui por meio da legislação, financiamento e planos de desenvolvimento. Além disso, nas Escolas finlandesas, investe-se muito na cooperação entre Escola e família.

ZH – Como a sociedade pode fazer com que essas diferenças entre Escolas públicas e privadas sejam amenizadas?

Jaana – Garantindo recursos para Escolas públicas, na tentativa de diminuir as diferenças entre as Escolas. A Escola pública deve se tornar uma opção atrativa para que pais possam optar por ela em vez da particular. Diminuir a desigualdade entre os Alunos gera melhores resultados para todos.

ZH – Que medidas implantadas na Educação finlandesa poderiam ser aplicadas em um país como o Brasil?

Jaana – Antes de mais nada, deveria se investir fortemente no desenvolvimento do sistema público de Ensino e na diminuição das diferenças entre Escolas. Outro passo importante no modelo finlandês, que poderia ser aplicado em outros locais, é a inserção de crianças de origem socioeconômica diferente na mesma sala de aula.


Na internet: lições grátis para milhares

Pela criatividade e necessidades que supriram, duas iniciativas surgiram em Porto Alegre e rapidamente se espalharam via internet para todo o país. São os portais Aula Livre e Me Salva!, acessados por milhares de estudantes que buscam, em vídeo, preparar-se para avaliações do que bem entenderem – de vestibulares a provas de cálculo.

O Aula Livre (aulalivre.net) foi criado enquanto o publicitário Eduardo Lima, 30 anos, e a relações públicas Juliana Marchioretto, 28 anos, estudavam para concurso. Eles perceberam que faltava espontaneidade nos vídeos de Ensino à distância.

– Será que a gente não conseguiria trazer nossos conhecimentos da comunicação e oferecer esse conteúdo de forma gratuita e com qualidade? – perguntaram-se.

Em pouco tempo, o Aula Livre estava no ar. A empresa que começou pequena agora ganha o gás da aceleradora carioca Pipa, conquistou novos sócios e tem mais de 1,1 milhão de visualizações em vídeos todos os meses.

Foi também por querer contribuir com um Ensino melhor que o estudante de Engenharia Miguel Andorffy, 23 anos, criou o portal Me Salva! (mesalva.net). Fera em cálculo, o jovem desenvolveu o projeto para ajudar outros universitários que sofriam com a infinidade de números. Hoje, o portal tem mais de 50 mil visualizações diárias.

Mas por que Juliana, Eduardo e Miguel resolveram se dedicar a melhorias na Educação?
– Não importa se você pode ajudar uma ou um milhão de pessoas. Cada um pode contribuir, com trabalho voluntário, incentivo financeiro, boas ideias, ou mesmo pela participação no desenvolvimento Escolar dos filhos – resume Eduardo.

Editorial: A escola é de todos

Uma lição que pode ser copiada em qualquer lugar, sem restrições, tem contribuído para que a Educação básica supere ou reduza deficiências históricas no Brasil. O ensinamento a ser compartilhado é o do envolvimento comunitário no Ensino formal. Como mostrou reportagem publicada ontem por Zero Hora, na sequên-cia da campanha.

A Educação Precisa de Respostas, promovida pela RBS e pela Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho, exemplos nacionais e mundiais são referência a todos os que pretendem contribuir para a superação das dificuldades do Ensino. Escassez de recursos, deficiências na formação e no aperfeiçoamento dos Professores, baixos salários do magistério e degradação de prédios e equipamentos não podem ser obstáculos à participação das comunidades na vida das Escolas. Pelo contrário, são muitos os casos em que atitudes participativas ajudaram a atender demandas que a estrutura institucional não consegue contemplar.

O foco é essencialmente a Escola pública, como observou, em entrevista a este jornal, a ministra da Educação da Finlândia. Disse a senhora Jaana Palojärvi que uma Educação plena e eficiente deve ser assegurada pelos governos, como possibilidade concreta de redução das desigualdades sociais. Mas os resultados dessa Escola pública somente serão efetivos, como ocorre na Finlândia, se os pais e os organismos comunitários forem cúmplices de gestores, Professores e demais servidores da Educação.

Ressalte-se que a participação não deve ter a pretensão de concorrer com os profissionais da área ou substituir suas atribuições. A adesão das comunidades aos projetos da Escola, nas mais singelas tarefas e responsabilidades, é complementar. Tal participação se revela na presença dos pais na Escola, no acompanhamento do aprendizado dos filhos em casa e no compartilhamento de angústias e projetos comuns a todas as famílias.

O Brasil já tem bons exemplos de cumplicidade comunitária, que merecem ser imitados, para que a Educação vá além do que se ensina e se aprende numa sala de aula. 


Fonte: Zero Hora (RS)

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