quinta-feira, 3 de outubro de 2013

"DESAFIO NA EDUCAÇÃO INFANTIL É MUDAR NOSSA VISÃO SOBRE OS BEBÊS"

Zilma de Oliveira, do Conselho Municipal de Educação de São Paulo, diz que habilidades naturais são mal avaliadas e creches não garantem equidade de atendimento

O papel da educação infantil na vida de bebês e crianças que devem ser atendidos nessa fase – que vai de 0 a 5 anos – não é consenso em todas as unidades de atendimento do País. A "visão da sociedade" sobre as habilidades naturais deles, o que significa sua capacidade de aprendizado, é mal avaliada. Com isso, a oferta de educação infantil perpetua desigualdade de direitos.

A avaliação é da professora associada da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (USP), Zilma de Moraes Ramos de Oliveira. Integrante do Conselho Municipal de Educação de São Paulo, a pesquisadora conversou com o iG sobre as dificuldades de se implementar a educação infantil no Brasil, que ainda não tem oferta obrigatória (exceto a partir dos 4 anos de idade).

A demanda por creches, no entanto, tem se tornado cada vez maior. E o currículo que define o que essa fase de ensino deve garantir aos alunos – desenvolvimento de habilidades ou cuidados mínimos para os bebês e crianças – ainda não é consenso em todas as redes e nem mesmo na sociedade. “O principal desafio na educação infantil é mudar nossa visão dos bebês, porque as pessoas ignoram as possibilidades de aprendizagem deles”, afirma conselheira.

Confira os principais trechos da entrevista:

iG: Quais são os maiores desafios do País na educação infantil? É só garantir acesso?

Zilma Oliveira: A demanda não é só pelo acesso à vaga, mas também pelo direito da criança de ser estimulada e desenvolver seu vocabulário. Na verdade, há vários desafios nessa etapa, mas o principal é mudar a visão que a sociedade tem de um bebê, de uma criança.

As pessoas ignoram as possibilidades de aprendizagem deles. Não estamos falando em fazer treinamento precoce não, mas sim das habilidades naturais de um bebê. A equidade de atendimento não está garantida no Brasil porque muitas creches estão preocupadas apenas com a guarda da criança. Também é errado pensar na educação infantil para crianças de 3 ou 4 anos como uma miniescola. Ela é um sistema educacional, mas nos obriga a mudar nossa ideia de educação, inclusive nas séries mais adiantadas. Temos uma população que ignora as possibilidades da educação infantil e fica feliz se a criança for bem cuidada e não tiver assaduras. Temos de mostrar a ela que é possível crescer mais.

iG: O que é importante para garantir isso? Assim como em outras séries do ensino fundamental e médio, estamos falando de criar um currículo para essa etapa?

Zilma: Há um grande olhar de renovação curricular para o ensino fundamental, porque as pessoas já perceberam que ir para a escola e ficar sentado copiando no papel deveriam ser coisas do passado. O currículo nada mais é do que o que você faz no cotidiano escolar e, mesmo quando o conceito é de cuidado apenas, há um currículo. Porque a criança aprende a não chorar, aprende a ficar quieta, aprende a se sentar. Os educadores de educação infantil estavam horrorizados com esse currículo de obediência e horrorizados com currículo de escola, então brigaram para ter outro tipo de currículo. As Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil foram feitas para atender essa demanda.

iG: Mas as diretrizes são suficientes para atender a essas demandas por orientação?

Zilma: As formações dos professores ainda não estão examinando as novas diretrizes. Há quem acredite que elas não são suficientes, mas elas são claras. É preciso lembrar também que, por lei, os métodos que os professores e as escolas vão adotar são abertos. Desde que se assegure a aprendizagem, não se pode padronizar métodos. A versão que se tem é a base curricular nacional.

iG: A senhora acredita que seja necessário flexibilizar regras para que os municípios consigam ampliar e construir novas creches?

Zilma: Esse problema de ter documentação em ordem existe para alguns municípios sim. Mas o outro e maior problema para os municípios é a manutenção das creches. É muito mais fácil construir creches do que pagar pela manutenção, que inclui professores, servidores, limpeza. Alguns municípios dão conta de manter e outros não. É difícil para todos, mas para alguns é quase impossível. Esse problema do financiamento tem de ser resolvido.

Fonte: iG

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