quarta-feira, 6 de junho de 2012

Paraíba é segundo melhor do Nordeste em matemática

Para a coordenadora geral do Todos Pela Educação, Andrea Bergamaschi, a situação paraibana se agrava a partir dos anos finais do Ensino Fundamental, afastando o estado da média nordestina

"Quantos anos você tem?", pergunta o repórter. Segundos se passam, sem que o pequeno Alexandre, morador de Alhandra, consiga responder à questão. "Dez", responde ele, depois de um tempo contando os dedos. "Tu não tem 10 anos não", questiona a colega que assistia à cena calada, até então. Esperta, ela completa: "tu ‘tem' oito. Assim, ó", diz, mostrando o numeral usando as mãos. Com olhar de estranheza, o pequeno Alexandre olha também para as suas, fazendo o "oito", mas não soube, enfim, dizer sua idade. Histórias como essa, que, para muitos, parecerá irreal, não são exceção e acompanham estudantes até as séries mais avançadas do ensino.
A Paraíba, por exemplo, aparece como o segundo Estado do Nordeste com o maior percentual de alunos com aprendizado adequado em Matemática, ao final do 3º ano do ensino médio. Com um índice de 8,3%, só perde para Sergipe, com 8,7%. Apesar da "vitória parcial", as estatísticas são autoexplicativas e revelam que não se tem o que comemorar, tendo em vista que a grande maioria, equivalente a 91,7%, não tem as capacidades esperadas para esse patamar. Da mesma forma, o indicador paraibano fica aquém do nacional, que é de 11%.
De acordo com a coordenadora geral do Todos Pela Educação, Andrea Bergamaschi, as estatísticas paraibanas já são preocupantes pelo simples fato de sempre se mostrarem abaixo das nordestinas. Contudo, aponta ela, a situação se agrava ainda mais a partir dos anos finais do ensino fundamental, afastando o Estado da média nordestina e aprofundando ainda mais a distância da média nacional.
"Em Matemática, a média da Região Nordeste no 9º ano (8ª série) é de 10,2% de alunos com aprendizado adequado, que já é baixíssimo e longe da nacional, de 14,8%. Mas, na Paraíba, o percentual é ainda menor, de 9,4%. Parece haver realmente um problema um pouco mais concentrado nessa faixa etária, mas que já vem dos anos anteriores", ressalta Bergamaschi.
"Sem varinha de condão"
O secretário de Educação do Estado, Harrison Targino, afirmou, entretanto, que os problemas no ensino estão distribuídos durante todo o período de aprendizagem, com maior atenção durante os primeiros anos da educação, quando são acumulados os conteúdos imprescindíveis para as demais etapas. "A Paraíba ostenta, sim, dados que merecem e exigem ação comum de todos, porém, mais do que levar números, é preciso buscar soluções. Estamos com índices abaixo do que deveriam estar, mas, de 2010 para 2011, já avançamos em vários aspectos", apontou o secretário, listando alguns dados estatísticos.
"Tenho em mãos um relatório do Inep e do MEC que mostram que a taxa de abandono escolar na Paraíba, no ensino fundamental da rede estadual de ensino, caiu 12,4% em 2010 para 11,1% em 2011. No Médio, caiu de 20,3% para 19%, mas não se faz nada com varinha de condão. Não é possível que, em pouco mais de um ano, consigamos reverter esse quadro", enfatizou o secretário. Segundo ele, o processo é gradual, devendo mostrar resultados significativos já nos próximos 10 anos.
"Mato quem faz pergunta demais"
Durante visita da reportagem à Escola Municipal de Educação Infantil e Ensino Fundamental Adauto Ferreira de Paula, em Alhandra, uma cena, ao final da visita, chamou atenção. Afora as classes abarrotadas, um corredor que se tornou também sala de aula para 18 alunos e uma diretora adjunta que tem verdadeira devoção pelo ofício apesar das dificuldades, um garoto de 13 anos surpreende ao deixar sua turma e sair sem qualquer permissão. Meia hora depois, quando a equipe já se dirigia de volta ao carro, o mesmo garoto se encontrava na porta da escola, em pé.
Questionado sobre o porquê de estar ali, sem nada a fazer, o jovem não pronunciou nada, exceto palavras de raiva. Uma terceira questão foi suficiente para uma ameaça. "Vou matar quem me fizer perguntas demais". A surpresa só não foi maior pelo fato de o porteiro resumir a situação. "Ele é sempre assim. Não tem quem possa com ele. Não quer estudar nem respeita ninguém", lamenta Paulo José Teixeira, 53. Segundo ele, o garoto Marcos, que só então ganhara nome, está somente no quarto ano do ensino fundamental (3ª série).
"Infelizmente as crianças ficam muito vulneráveis. A região está infectada pela droga, como em todo canto. Ele vive com a madrasta e com o pai, que é mototáxi e fica fora o dia inteiro. Quando chega, estressado, faz vista grossa a tudo, por isso que Marcos é revoltado", resume, acrescentando: "já tivemos muitos como Marcos, de chegar ao ponto de a supervisora do município falar para uma das mães: ‘minha senhora, faça duas poupanças, porque você só tem duas opções. Uma, para enterrar seu filho. Outra, para quando ele crescer, pois vai dar no seu espinhaço'". 
PB tem pior percentual de conclusão do Médio
A Paraíba tem o pior percentual do País entre os jovens de até 19 anos que concluíram o Ensino Médio. No Estado, os indicadores do Anuário Brasileiro revelam que só 30,6% conseguiram terminar esta etapa dos estudos no período correto. O choque de realidade é gigante, quando analisados os dados do primeiro colocado: em Santa Catarina, na Região Sul, os índices são de 69,1%. Essa taxa de distorção, apontam os indicadores, atingem 28,3% já nos anos iniciais do ensino fundamental, sobem para 42,3% para os anos finais (9º ano) e recuam um pouco no ensino médio, quando chegam a 41,7%.
De acordo com o secretário de Educação do Estado, Harrison Targino, a adequação da idade à série apresenta-se como um dos maiores problemas da educação, junto à alfabetização de crianças com até oito anos. "Consequentemente, buscamos fazer com que esses jovens terminem o ensino médio aos 18-19 anos", disse. A coordenadora geral do Todos Pela Educação, Andrea Bergamaschi, vai além e ressalta que essa defasagem escolar é bastante prejudicial e é um dos principais fatores para a evasão escolar.
"E isso se agrava mais quando se atinge a segunda fase do ensino fundamental, onde o aluno encontra um novo contexto escolar: mais matérias, mais professores, maior nível de complexidade e, portanto, as dificuldades até então não bem resolvidas se aprofundam, o que pode fazer com que o aluno perca o interesse, tornando o aprendizado mais difícil", observa. Bergamaschi pontua, porém, que esta é uma realidade não só paraibana, mas brasileira. "O problema já não é mais o acesso à escola, mas a permanência e a qualidade do ensino", conta.
2º Objetivo do Milênio
Embora casos como o do garoto Marcos evidenciem a lacuna deixada pela educação no País, segundo a coordenadora do Programa de Educação do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), Maria de Salete Silva, ela é capaz sim de gerar transformações sociais. "A educação básica e de qualidade para todos é o segundo dos Oito Objetivos do Milênio (ODM), da Organização das Nações Unidas (ONU). Não há possibilidade de combate à violência sem educação", afirmou. O objetivo da ONU é cumprir os ODM até 2015.
Da mesma forma pensa a coordenadora geral do Todos Pela Educação, Andrea Bergamaschi. "Investindo na redução da desigualdade educacional, reduzimos as demais", indica. "A educação agora passa a ter um papel estratégico ainda mais essencial, mas é preciso que ela faça sentido para os adolescentes. Não adianta trancá-los dentro de escola, se aquilo não fizer sentido para ele, porque ele não vai estar lá. É como dizem: o corpo está, mas a cabeça não. É preciso ter a cabeça, o corpo, e o coração do menino na escola. Para isso, é preciso ouvi-lo, saber o que o atrai e o que o expulsa. Isso é fundamental", finaliza.

Fonte: Correio da Paraíba (PB)

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