sexta-feira, 19 de julho de 2013

COMPROMISSO E RIGOR NA GESTÃO

Cumplicidade e o envolvimento da equipe são algumas das características de uma boa direção escolar

Estar presente em todos os espaços da escola. É assim que Sara de Carvalho Castro, diretora da Escola Municipal Roberto Burle Marx, que fica em Jacarepaguá, no Rio de Janeiro (RJ), atua em seu cotidiano. “O diretor deve monitorar tudo, deve avaliar a qualidade do serviço que está sendo prestado na escola, e onde cada um pode melhorar. Deve estar atento sempre, a cada avanço, a cada obstáculo, e não ficar fechado dentro de uma sala”, ressalta.

Destaque na rede municipal de ensino carioca, a escola é a primeira colocada da rede e quarta melhor do País, nos anos finais do ensino fundamental, no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de 2012. A receita para o bom desempenho, segundo a diretora, é uma só: “há um compromisso de todos”. Esse compromisso, na visão de Sara, surge pelo comprometimento com a educação e pelo rigor com que a sua gestão é efetuada, desde 2004, quando a escola foi fundada. “A gente monitora a frequência, monitora o aprendizado, e estamos sempre elevando a autoestima dos nossos alunos”, relata.

Além do bom desempenho dos alunos, a escola é modelo de organização, estrutura adequada e ambiente saudável. “Meu rigor não passa só pelo aluno, mas também pelos professores. Nesta escola, eles não faltam, não chegam atrasados e, no caso de uma eventualidade, os alunos não ficam sem aula, há sempre uma atividade preparada para ser aplicada”, conta a diretora. A atenção às necessidades dos professores também é foco prioritário da gestão. “Temos uma reunião pedagógica semanal, sempre com a minha presença. Proponho mudanças e busco sempre dar condições a todos para que desenvolvam um bom trabalho. Verifico se tudo está funcionando, do que os professores precisam e procuro providenciar logo. Nada deve ficar para depois, nada pode atrapalhar o aprendizado dos nossos alunos”, afirma.

A cumplicidade e o envolvimento da equipe são características destacadas por ela. “Na escola, é preciso que você acredite, dê exemplo e mantenha o foco. Assim, você contagia as pessoas”, observa. O rigor da direção inclui normas que não permitem a entrada de alunos sem uniforme e sem material. O aluno que não entrega os trabalhos solicitados acaba tendo que fazê-los na hora do recreio. Há hora certa até para ir ao banheiro, exceto casos de extrema necessidade. “Sou muito rigorosa, mas os alunos me adoram, porque o adolescente quer limites. Eles têm um respeito muito grande por mim e pela escola. Aqui você não vê um papel no chão porque eles mesmos cuidam, eles amam a escola”, conta. O trabalho para elevar a autoestima dos estudantes é outra prioridade: “a sociedade gosta de denegrir a imagem do aluno de escola pública. Procuro incutir neles que são tão bons quanto qualquer outro, e que isso exige bom comportamento deles na rua, no ônibus, no dia a dia.” A escola, que conta com 600 alunos da educação infantil ao 9º ano do ensino fundamental, destaca-se também na inserção de alunos na rede particular, para estudo com bolsa integral no ensino médio. De acordo com Sara, em torno de 85% dos alunos que saem de lá estão hoje em escolas da rede privada, para as quais os estudantes são avaliados para conseguir a vaga para a bolsa. Além disso, a diretora se diz próxima da comunidade escolar: “conheço a história de cada um dos meus alunos”.

Gestão eficaz

Para Ilona Becskeházy, consultora da Fundação Lemann, comentarista da área de Educação da rádio CBN e colunista revista Gestão Educacional, a gestão eficaz consegue harmonizar os recursos materiais e humanos de uma escola para fazer com que todos os alunos aprendam o que está definido como mínimo comum. “Nessa definição, seria bem difícil achar um gestor escolar público eficaz no Brasil, porque nem os recursos são adequados, nem há padrões claros que deva atingir”, comenta. No entanto, a especialista acredita que fazer com que os alunos aprendam o que é esperado – tanto em termos de conteúdos quanto em termos de habilidades escolares e comportamento civilizado na escola – deve ser a prioridade do gestor. “Para isso, ele deve criar um clima de altas expectativas, acolhimento das diferenças e dificuldades, clareza de objetivos e de regras e uma operação educacional eficiente”, orienta.

Para um modelo em que, como na escola carioca Roberto Burle Marx, a gestão tem participação efetiva para os resultados, Ilona considera crucial fatores como a escolha e o desenvolvimento de uma equipe competente e colaborativa, o estabelecimento de objetivos pedagógicos claros, a seleção de material didático com atividades apropriadas, desafiadoras e instigantes, a interação com as famílias e o controle operacional da prestação de serviços educacionais em alto padrão – “não necessariamente caro e com recursos tecnológicos de última geração, mas com ambiente organizado e propício ao aprendizado e à manutenção de um clima de respeito mútuo”.

Elie Ghanem, pedagogo e professor de Sociologia na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), acredita que qualquer gestão, de qualquer organização, pode ser considerada eficiente se mobiliza os meios adequados para atingir os fins. “Saber se a gestão de uma escola, ou de um conjunto de escolas, é eficiente depende dos fins estabelecidos. Geralmente, não pensamos sobre isso ou não compartilhamos a definição dos fins com as pessoas que estão implicadas em uma escola ou em um conjunto de escolas”, alerta.

Ghanem aponta que entre as prioridades do gestor deve estar a criação de condições para que um número crescente de pessoas de diferentes categorias – estudantes, docentes, funcionários não-docentes, familiares e outras pessoas – se corresponsabilize pelas atividades educacionais, inclusive repensando seus fins e, com base neles, defina meios para atingi-los.

Para o professor, é essencial que a escola vise multiplicar e diversificar aprendizagens a fim de obter qualidade no nível de ensino e de aprendizado. “A escola precisará ser um ambiente que incentive a formulação de perguntas, a definição de necessidades individuais e coletivas e a busca de respostas para tais perguntas e necessidades. Isso em relação a todas as pessoas envolvidas, não apenas estudantes e docentes”, afirma. E completa: “com tal suposição, uma boa gestão escolar deslocará o ensino do centro das atividades educacionais e colocará a aprendizagem em seu lugar. Se docentes adotarem essa posição, vendo-se como ‘aprendizes’, tenderão a favorecer o aprendizado próprio e das demais pessoas, inclusive alunos”. Vale o mesmo para gestores situados em níveis superiores da hierarquia administrativa de sistemas escolares: supervisores, coordenadores, diretores de órgãos de Secretaria de Educação, de ministérios, inclusive o da Educação.

Comunicação

A habilidade de comunicar-se é uma característica fundamental do gestor que pretende desenvolver um bom trabalho. Segundo Ilona, o aspecto mais importante é saber comunicar ideias e objetivos. “Depois, ouvir e acolher as dificuldades, sem passar para o paternalismo, e estimular a colaboração mútua, a troca de ideias e o trabalho conjunto em busca de um objetivo comum”, sugere.

O professor Ghanem observa ainda que é importante o gestor saber despertar as qualidades dos profissionais que compõem a equipe escolar. “Devem ser incluídas as qualidades consideradas positivas e, também, as negativas, juntamente com confiança, para que as pessoas da equipe possam explicitar as qualidades que têm e colocá-las diante de sua própria apreciação e das demais”, diz. Ele comenta que o gestor deve adotar uma atitude de escuta: “ouvir as pessoas querendo entender seu modo de pensar e sentir e criar momentos com tempo especificamente destinado a isso. Quer dizer, dialogar”.

Ilona indica a adoção de sistemas de avaliação inteligentes e objetivos, que podem ser uma ótima ferramenta para despertar as qualidades dos profissionais. “Os objetivos institucionais, as habilidades e competências que contribuem para sua consecução, e as características pessoais que atrapalham a equipe devem ser constantemente mapeadas e abordadas, de forma objetiva e respeitosa, para promover o autoconhecimento e o conhecimento mútuo entre membros da equipe”, comenta.

Plano de metas

Integrar a equipe escolar num plano único de metas e objetivos é outro aspecto que faz a diferença para uma boa gestão. Ilona recomenda que o gestor proponha ideias e objetivos para a equipe que deve, por sua vez, apresentar as suas sugestões, até que se forme um plano coerente e factível. Esse plano deve ser desdobrado em etapas e metas, tarefas e cronogramas, que são rotineiramente avaliados em conjunto, bem como com a busca pelas soluções. “O gerenciamento das metas e das rotinas parece muito chato de longe, mas são mecanismos poderosos para se integrar uma equipe em torno de objetivos comuns”, completa.

Para o professor Ghanem, essa integração é simples, mas não é fácil. “Deve-se conceber coletivamente o plano. A concepção não pode ser separada da execução. Quem concebe, executa, e quem executa, concebe”, considera. O trabalho da escola também deve estar em sintonia com toda a comunidade escolar. “É preciso entender as pessoas que são profissionais da escola como uma equipe que é parte de uma equipe maior, que inclui alunos, seus familiares e a comunidade do entorno. Nessa linha de crescente comunicação e envolvimento, deve ser elaborado coletivamente um plano em que toda essa gente tenha peso para estabelecer objetivos e se reconheça com tarefas para realizá-los”, orienta. Ele também defende a inclusão constante de momentos e mecanismos para avaliar o que foi planejado e o que foi realizado.

“Acho que cabe ao líder da escola conhecer bem seus recursos e demandas para ter seu próprio plano, que deve ser discutido e melhorado pela comunidade escolar. Mas alguém dá a palavra final, pois, em última instância, há responsabilidades legais e morais em jogo”, acrescenta Ilona.

Fonte: Revista Gestão Escolar

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