segunda-feira, 29 de julho de 2013

EVASÃO EM LICENCIATURA CHEGA A 39%

Quatro em cada dez alunos que iniciam uma graduação voltada à formação de professores não chegam ao fim do curso no Paraná

Quase 40% dos alunos que iniciam alguma licenciatura no Paraná não chegam a se formar. Todo ano, em média, 15,3% desistem dos cursos, voltados principalmente à formação de professores para a educação básica (ensinos fundamental e médio). Os dados, levantados pelo Instituto Lobo com base no Censo Escolar, revelam a dificuldade que é formar novos docentes e como a sala de aula está longe de ser capaz de atrair esses profissionais.

“Não há estímulo. A carreira não atrai, o salário não atrai. Isso tem impacto direto na qualidade da educação. Em algumas regiões, alunos da educação básica estão há anos sem aulas de ciências por falta de professores”, avalia o presidente do Instituto Lobo, Roberto Leal Lobo.

A fuga da sala de aula não se restringe ao Paraná. Em todos os estados, o índice de evasão é considerado alto. De acordo com a média nacional, 48% dos alunos de licenciatura não chegam a se formar. A cada ano, 19,6% desistem do curso.

O mapeamento nacional mostra índices preocupantes em todas as áreas de conhecimento. Em Física, a taxa de evasão anual é de 26,4% e mais de 60% dos alunos não chegam a terminar o curso. Entre quem cursa literatura estrangeira, 24,5% desistem a cada ano e quase 57% saem da faculdade antes de pegar o diploma.

O desempenho em alguns cursos de instituições paranaenses supera a média do país. Na Universidade Estadual de Londrina (UEL), o índice de evasão – calculado entre 1992 e 2011 – chega a 56% em Matemática e em Física, ambos do período noturno. Os mesmos cursos também obtiveram as maiores taxas na Universidade Estadual de Ponta Grossa: 69% em Matemática e 40% em Física (dados de 2013). A reportagem também consultou outras três universidades públicas do Paraná, mas elas não tinham os dados compilados até o fechamento desta edição.

Sinal vermelho

O governo do Paraná criou um fórum para tratar do problema e tentar reverter a falta de atratividade da licenciatura. A Secretaria da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Seti) está compilando dados de evasão nas instituições e identificando gargalos para, a partir deste diagnóstico, definir políticas para o setor.

O chefe da assessoria de planejamento de ensino superior da Seti, Décio Sperandio, adianta que as ações terão três focos: os alunos que ainda não ingressaram na licenciatura (para atraí-los a esses cursos); os que já estão cursando (com objetivo de evitar a evasão); e os já formados (para que continuem se capacitando). “Há um certo desinteresse pela licenciatura. Então, vamos desenvolver algumas estratégias para atrair novos professores e mantê-los em sala de aula. Para isso, é preciso valorizar a educação básica e a carreira de professor”, disse.

Baixos salários afugentam futuros docentes ainda no curso
O bolso é um dos fatores que mais espantam os candidatos a professor da educação básica. Para especialistas, a baixa remuneração não só desestimula os alunos de licenciaturas a seguirem nos cursos, como faz com que migrem para outras áreas ou à iniciativa privada. No Paraná, um professor com licenciatura plena recebe remuneração inicial de R$ 1.112 por 20 horas semanais de trabalho, segundo a APP Sindicato.

Para a doutoranda em educação, Luciana França Leme, da Universidade de São Paulo (USP), os governos precisam lidar com o problema de forma integrada, traçando metas de melhoria para curto, médio e longo prazos. “Mas a primeira medida é aumentar o salário. É fazer com que o docente se sinta valorizado. Tem estados que sequer pagam o piso. É inadmissível”, disse.

Para Maria Helena Guariente, diretora de apoio à ação pedagógica da UEL, as universidades têm se mexido para amenizar o problema, por meio da adesão a programas de incentivo à permanência na licenciatura. “O salário desmotiva, então precisamos buscar alternativas de rever esse processo, para dar boa formação aos alunos e evitar que eles deixam a licenciatura”, disse.

Bolsas
Uma dessas alternativas é o Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (Pibid). Lançada em 2009 pelo governo federal, a iniciativa oferta bolsas de R$ 400 a alunos de licenciatura, para desenvolvimento na área. No Paraná, dez instituições públicas aderiram ao projeto. Unidade que mais mantêm bolsas pelo Pibid, a UEL tem 720 alunos beneficiados.

“É muito parecido com a residência médica, porque o bolsista fica em uma escola, vivenciando aquela instituição e desenvolvendo atividades. Os resultados têm sido muito bons”, disse o professor Sérgio Arruda, coordenador do Pibid na UEL.


>Nas faculdades, alunos estão desmotivados
No segundo semestre de 2010, Alice Mara de Freitas, hoje com 20 anos, começou a cursar Física na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTPFR) com o nobre sonho de lecionar. Mas as fracas perspectivas salariais a fizeram deixar de lado as fórmulas e experimentos. Desestimulada, abandonou a graduação. “O curso é muito pesado. Então, seria um esforço muito grande para uma remuneração pequena que eu teria depois de formada. Vi que não valeria a pena”, conta. Hoje, Alice cursa Infor­­mática Biomédica na Univer­­sidade Federal do Paraná (UFPR).

Já Andressa Alves de Oli­­veira, de 25 anos, está no último ano de Letras na Universidade Tuiuti do Paraná. Porém, ao sentir na pele a desvalorização a que os professores estão relegados na rede pública, ela tem dúvidas se vai para a sala de aula após se formar. “Durante o estágio, fiquei completamente desiludida com a indisciplina e desrespeito dos alunos. Tive dúvidas se há como mudar isso”, lamentou.


>Desinteresse
Metade dos alunos de licenciatura não sabe se vai lecionar

Mesmo para os alunos de licenciatura que não abandonam o curso, a carreira de professor parece não ser tão atrativa. O desinteresse é comprovado na dissertação de mestrado, concluída no ano passado, da pesquisadora Luciana França Leme, da Universidade de São Paulo (USP). Ela ouviu universitários de licenciaturas da instituição e descobriu que quase a metade não quer ou tem sérias dúvidas se vai lecionar após concluir o curso.

Em Física, 47,5% dos universitários não querem ou não sabem se querem ser professores. No curso de Matemática, o índice chega a 45,2%. Em Pedagogia, o problema é um pouco menor: 24,3% dos alunos não sabem ou não querem ir para sala de aula depois da formatura.

“Os resultados indicam que é a profissão [professor de ensino básico] que não tem sido atrativa. É preciso segurar essa metade dos alunos que querem lecionar e criar estímulos para essa parcela que está desmotivada e quer ir para a sala de aula”, diz Luciana.

Fonte: Gazeta do Povo (PR)

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